As empresas de transporte coletivo do estado do Rio devem informar aos usuários do RioCard ou sistema equivalente os valores remanescentes creditados como vale-transporte. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou que a conduta adotada pelas empresas de transporte coletivo de omitir o saldo do cartão naquelas contas superiores a R$ 20,00 viola o direito do consumidor à informação e é passível de responsabilização judicial.
De acordo com o Ministério Público, desde julho de 2005, as empresas de transporte deixaram de informar ao usuário o saldo dos cartões, o que compromete aqueles que pegam várias conduções em um só dia e ficam sujeitos a não ter como pagar uma das viagens por saldo insuficiente. Segundo o órgão, o número de validadores existentes nas casas de comércio é pequeno e desproporcional à massa de usuários que usam o sistema, e falha ao não informar adequadamente o consumidor sobre o valor disponível.
O Ministério Público ajuizou ação contra a Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) para que ela volte a informar o saldo total do bilhete, por meio de todos os validadores do bilhete eletrônico RioCard ou outro equivalente, seja no momento da recarga, seja no da realização do débito das tarifas. O Ministério Público pediu também que os usuários recebessem compensação por dano moral pela omissão das empresas de ônibus.
Na ação, o MP assinalou que a falta de informação do sistema contraria inclusive propaganda divulgada pela Fetranspor, e pediu a compensação por danos morais coletivos no valor de R$ 500 mil a cada mês que a entidade deixasse de prestar as informações de maneira adequada.
A Fetranspor alegou que não poderia pagar indenização aos passageiros porque atua por delegação das empresas filiadas, na qualidade de entidade sindical, e não recebe remuneração pela emissão dos bilhetes. Afirmou também que o Ministério Público não poderia atuar na causa porque não haveria relação de consumo entre a entidade e os usuários. Para a Fetranspor, os trabalhadores não adquiriam os créditos de passagem na condição de consumidores, mas em decorrência de uma relação de emprego.
A Terceira Turma considerou que o Ministério Público tem legitimidade para propor ação porque se trata de direito individual homogêneo, ou seja, de todos os usuários do transporte público na região metropolitana do Rio de Janeiro, o qual possui sistema de bilhetagem eletrônica, ficando evidenciada a sua relevância social.
Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, a Lei 7.347/85, que dispõe sobre a legitimidade do Ministério Público para a propositura de ação civil pública, é aplicável a quaisquer interesses de natureza transindividual, tais como definidos no artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), ainda que eles não digam respeito às relações de consumo. Para justificar a atuação do órgão, basta a demonstração da relevância social da questão.
Também ficou definido que a Fetranspor deve responder judicialmente pelas empresas porque a responsabilidade de todos os integrantes da cadeia de fornecimento é objetiva e solidária, conforme os artigos 7º, parágrafo único, 20 e 25 do CDC.
No mérito, a ministra Nancy Andrighi destacou que a falta de acesso à informação suficiente e adequada sobre os créditos existentes no bilhete eletrônico viola o disposto nos artigos 6º, III, e 30 do CDC, especialmente quando foi garantida em propaganda veiculada pelo fornecedor. Ela assinalou que, muitas vezes, as pessoas saem de suas casas apenas com cartão eletrônico e sem dinheiro extra para pagar a condução, e precisam saber exatamente qual o crédito existente em seus cartões para se programar.
Para a ministra, a simples demonstração gráfica da redução dos créditos, como ocorre, não satisfaz essa necessidade, “até porque ninguém é obrigado a interpretar gráficos quando tem o direito de saber qual o valor exato, em moeda corrente, dos créditos que possui no cartão eletrônico”.
“Se todos os validadores são aptos a prestar informação completa ao consumidor, não há razão para que este se restrinja àqueles localizados em algumas poucas lojas e supermercados, aos quais nem todos os consumidores têm acesso”, ressaltou. “Menos ainda se justifica que essa informação fique disponível apenas na internet, tendo em vista que o acesso ainda é restrito”, acrescentou.
A Terceira Turma concluiu que aqueles consumidores que se sentirem lesados ou sofrerem algum constrangimento pela falta de informação podem ingressar com ação individual para tentar obter reparação na Justiça. Entretanto, a Fetranspor não precisa pagar indenização por meio de liquidação de sentença coletiva, como queria o Ministério Público, por se tratar de dano incerto.
Para a relatora do processo, embora a situação possa ter causado aborrecimentos aos trabalhadores, “não há dano moral quando os fatos narrados estão no contexto de meros dissabores”.
Fonte: Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ
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